E lá estavam eles, sentados no bar de
sempre, falando sobre o de quase sempre.
Eram companheiros de copo há muitos anos e havia algo em comum: não
entendiam de futebol. Pelo menos esse que se fala atualmente na internet, no rádio e na
televisão. Por exemplo, agora existe o tal do "pivô", do "ala" e costumam chamar passe de "assistência".
Mas eles não. São ex-boleiros do campo ondulado, de grama alta ou de terra socada, onde não
há
estatísticas, glamour ou replay. E não compreendiam como alguém
que se formou em jornalismo e que nunca chutou uma bola na vida, podia falar
com tamanha "propriedade" sobre tudo o que acontece dentro das
quatro linhas. Afinal, até onde eles imaginavam, não
existe faculdade com aprendizado ou disciplina de futebol.
São os novos "profissionais da mídia" que fazem questão de falar difícil sobre algo tão simples.
Mas naquela noite e naquela mesa de boteco, eles assistiam a mais uma partida da Copa do Mundo. Bélgica x Estados Unidos. Mais um jogo duro, disputado.
Um deles, incrédulo em relação à
autenticidade do torneio, disse que a Copa no Brasil estava indo bem, com bons
jogos e muitos gols, apesar de "encomendada" para a seleção
anfitriã.
O outro riu e respondeu:
" - Mas então pagaram com cheque, certo? Porque se não
fosse a trave, tudo já teria acabado para os donos da casa nas
oitavas-de-final."
O parceiro, irritado por ter sido contrariado, afirmou que, no final, os quatro primeiros seriam Brasil, Argentina, Alemanha e Holanda. Nessa ordem.
" - Sim, são equipes fortes, no mínimo
competitivas, que se respeitam entre si. Possuem tradição, camisa. Se
for nessa ordem, nada mais lógico". Foi a resposta.
Mais irritado, o outro riu de maneira sarcástica
e perguntou se ele realmente acreditava que a seleção brasileira
ganharia por méritos, mesmo com o "futebolzinho" medíocre?
" - Não. Vai ser campeã por demérito.
Se tivesse um pouco mais de preparo, especialmente psicológico, ou de mérito como queira, seria campeã de maneira bem mais simples. O Brasil não está
jogando como favorito. Está obrigado a vencer a Copa. Não
fosse essa pesada obrigação, da imprensa à torcida, as coisas seriam bem
mais naturais, mais tranquilas".
Em sua visão, nenhuma outra seleção jogou tão melhor nesta Copa que a brasileira. Não há um time a ser batido, todos se equivalem. As seleções que o amigo citou como "as quatro primeiras" podem ser de fato campeãs como também já poderiam ter sido eliminadas nas oitavas-de-final. O Brasil foi salvo pela trave, na prorrogação e nos pênaltis. A Holanda classificou-se no último minuto assim como a Argentina, no fim do 2º tempo da prorrogação. E a Alemanha, que já havia sofrido para empatar com Gana na primeira fase, teve enorme dificuldade para passar pela inexpressiva Argélia.
Além de que os goleiros roubaram a cena em várias partidas, mesmo com a enxurrada de gols. A "Copa do sufoco" possui a maior média de gols da história.
" - Algum desses jogos teve indícios de favorecimento?", questionou ao colega ainda contrariado.
Uma pausa para encher os copos. Silêncio.
" - Pelo contrário. Todos esses jogos tiveram ares de crueldade para o torcedor, cheios de adrenalina, tensos", conclui.
O outro, querendo logo encerrar, indagou:
" - Mas e o alto investimento que foi feito no país? Como fica?"
" - Esse foi o esquema. Agora é só futebol".
" - Então fica aí com seu futebol romântico, à moda antiga, de verdade, com emoção ao invés de razão".
Os dois riem, pedem a saideira e terminam por ver a vitória da Bélgica, novamente na prorrogação por sinal, placar apertado de 2 x 1.
E um deles sorriu mais feliz, porque sabe que o futebol não se traduz somente em dinheiro, fama, números ou termos técnicos e táticos. Mas puramente emocionais.
2 comentários:
Pra comprar uma Copa teríamos que ter só um estádio e nada de investimentos no país, mesmo recheados de corrupção. Enfim, a conta de quem comprou esta no vermelho e cheque caiu sem fundo.
A Copa do Mundo, aqui ou em qualquer outro lugar, é um "show business" altamente lucrativo nos bastidores. No palco, o futebol está acontecendo de verdade.
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