quarta-feira, 27 de julho de 2016

A OLIMPÍADA E O IMPOSTÔMETRO

*por Adriano Oliveira

Sexta-feira, 22 de julho de 2016. Exatamente às 14h18 e a pouco menos de 15 dias do início dos Jogos Olímpicos, no Rio de Janeiro, o "Impostômetro" da Associação Comercial de São Paulo anunciava um índice nada animador: o valor pago pelos brasileiros em contribuições, taxas e impostos federais, estaduais e municipais desde o primeiro dia do ano, já somava R$ 1, 1 trilhão.


Além de algumas expressões impublicáveis, isso significa que, assim como no ano passado e também no ano retrasado, o cidadão que acorda cedo para trabalhar pagou mais e elevados impostos. E mesmo diante de tal exorbitante arrecadação, engolido por uma enorme crise política e uma forte recessão econômica, o Brasil cresceu menos. Ou decresceu.
Mas o tempo não pára. Em poucos dias, o eterno "país do futuro" será o palco de uma Olimpíada em seu mais belo cartão-postal, sua cidade maravilhosa, situada a beira-mar num país tropical abençoado por Deus e bonito por natureza.
Afinal, com mais de R$ 1, 1 trilhão arrecadados em impostos em pouco mais de um semestre, entende-se que seria obrigação do poder público investir em transporte, aeroportos, segurança e hospitais. Não deveríamos depender de um megaevento esportivo internacional para se ter a esperança de dias melhores em ítens básicos de infraestrutura urbana. Seja qual for o partido político que esteja no poder (isso é o que menos deveria importar).
Assim como há dois anos fizemos a "Copa das Copas", segundo nossos dignitários ilustres políticos, também somos capazes e temos condições suficientes de fazermos a melhor Olimpíada da história. Por que não? Além do mais, teremos o tão esperado "legado" no dia seguinte aos Jogos Olímpicos.
E de quanto será esse custo para a sociedade? Pois é. O discurso político de que um evento desse porte terá um saldo positivo fica a cada dia mais fantasioso num país que já entra em quadra ou mergulha na piscina com o placar amplamente desfavorável pelo ônus social e das urnas.
O cidadão comum, aquele que neste ano já pagou mais de R$ 1,1 trilhão em impostos, não consegue fechar os olhos para o que acontece fora da Vila Olímpica. Existe um outro Brasil ao redor e não há como ignorá-lo. Há quem diga que é a chance de o país celebrar "a festa do esporte mundial". Pode ser. Mas fica a pergunta: como o esporte é de fato tratado no Brasil por seus governantes?

(uma pequena pausa na leitura para refletir).

Como seria bom se o Brasil fosse pelo menos medalha de prata nos aeroportos, nos hotéis, nos ônibus, nas filas, no salário mínimo, nos metrôs, na inflação, nos trens, no emprego, na polícia. Ou como seria menos ruim se nossa política fosse, no mínimo, medalha de bronze. Contudo, da mesma maneira que "não se faz uma Copa construindo hospitais", como certa vez declarou Ronaldo Fenômeno (e realmente não se fez), também não se faz uma Olimpíada construindo ou reformando escolas.
Por que então não se faz obras públicas usando impostos da mesma forma que foram construídas as modernas e caras arenas padrão FIFA? As mesmas arenas que, dois anos depois, com raríssimas exceções, se comprovaram deficitárias ou verdadeiros "elefantes brancos" espalhados pelo país?
Por que não se pode construir postos de saúde decentes sem licitação?
Por que não se pode capacitar e equipar a polícia em caráter de emergência para combater o crime organizado? 
E por que o Rio de Janeiro, em grave crise financeira, cujo governador decretou estado de calamidade pública dois meses atrás, resolve sediar um megaevento esportivo de quase R$ 40 bilhões?
Será que depois de tudo o que tem infestado a cada dia os noticiários deste país, com seus quase 12 milhões de desempregados, com seus outros tantos milhões de aposentados que trabalharam honestamente a vida inteira e que agora não têm mais direito à nada, alguém em sã consciência ainda votaria num candidato em outubro só porque ele trouxe ou realizou uma Olimpíada?
Com o pedido de socorro do governador, o presidente da República (interino, diga-se de passagem) facilitou  e viabilizou de forma bem rápida uma generosa "ajuda" ao Rio de Janeiro de quase R$ 3 bilhões de modo a garantir a realização dos Jogos Olímpicos.
Enquanto você leu esse texto, concordando ou não com o que está escrito, uma criança morreu no Brasil por falta de saneamento básico. Mas isso é apenas mais uma estatística.
Afinal de contas, a calamidade pública não é um problema olímpico.




Adriano Oliveira tem este Blog desde 2009, mas a paixão pelo futebol nasceu bem antes disso. É um apaixonado que vibra pelas 11 posições, mas sempre assume uma, pois jamais fica em cima do muro. Aos 43 anos, o futebol ainda o faz sentir a mesma coisa que ele sentia aos 10.

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