domingo, 17 de julho de 2016

NACIONAL x DEL VALLE, A REALIDADE QUE INCOMODA

*por Adriano Oliveira


Nada de uruguaios, brasileiros ou argentinos.
O mais cobiçado troféu da América será erguido em 2016 por mãos colombianas ou equatorianas. Quem diria.
O futebol mudou. E Atlético Nacional x Independiente Del Valle fazem a final de Libertadores mais tupiniquim dos últimos tempos. Talvez do último quarto de século.
Nada de Boca Juniors, São Paulo, River Plate, Colo Colo, Grêmio, Peñarol...
A tal da "camisa pesada" não mais se traduz em vitória dentro de campo.
O futebol está quase nivelado. E por baixo.
Hoje não vence quem tem mais talento. Quase sempre triunfa o time que erra menos. E, por consequência, quem arrisca menos. Afinal de contas, quem arrisca menos (além de errar menos) mantém mais a posse de bola e dá menos chances para o adversário. A clássica figura do maestro da camisa 10, aquele que pára a bola, que pensa o jogo e normalmente faz o "inesperado", corre agora o risco de perder todas as jogadas e prejudicar sua equipe, passando de herói para vilão da partida.
O que importa atualmente é ter um "conjunto forte". Um time entrosado, que toca e fica com a bola o máximo de tempo possível. E, claro, que tenha pegada forte para recuperá-la o quanto antes. Toca-se de qualquer jeito, para o lado, para trás, para "começar" tudo de novo, o importante é sempre ter e tocar a bola. E, se necessário, para os menos favorecidos em técnica, se "livrar" dela antes que o oponente chegue no lance.
O jogo acelerou. Ficou mais rápido. Mais preciso. Não permite mais a classe, a beleza, a irreverência. O negócio do futebol moderno é ter a posse da bola, jogar em velocidade, fazer o simples e, principalmente, ser eficiente. Cadenciar, driblar, plastificar a jogada, nem pensar. O espírito coletivo se sobressai à capacidade individual. As vezes, dentro de campo, o fanfarrão decide mais que o "engomadinho", aquele que sabe falar bem e que tem todos os dentes na boca. Porque é preciso mais alma, mais coração, mais pegada. É preciso algo a mais. O futebol de hoje, com menos espaços, mais força que técnica e mais velocidade que talento, colocou o craque e o jogador comum quase no mesmo patamar.
Às favas a tal da camisa que pesa! - exclamam sorrindo equatorianos e colombianos eufóricos.
Os times considerados pequenos existem e sempre existirão. Por outro lado, não são mais aqueles conhecidos "times bobos" de outrora, que se amedrontavam diante de outro "com mais camisa" ou dentro de caldeirões abarrotados de gente.


O Atlético Nacional não é um time brilhante. E talvez esteja na final exatamente por não acreditar que seja. Mas mostrou o melhor futebol dessa edição de Copa Libertadores e não tomou conhecimento da "camisa que entorta varal" em pleno Morumbi com mais de 60 mil são-paulinos. Tampouco o Independiente Del Valle é uma equipe sensacional, mas ganhou a vaga na final vencendo com propriedade o "temido" Boca Juniors nos dois jogos da semifinal, o último e decisivo na "mítica" La Bombonera transbordando de xeneizes fanáticos. Aliás, os equatorianos foram atrevidos demais diante de uma das camisas mais respeitadas do continente: Venceram, quando precisavam apenas de um empate fora de casa.
O Boca Juniors é sempre candidato ao título da Libertadores? La Bombonera é sempre o "caldeirão" mais temido pelos adversários?
Não é mais. O futebol mudou e a Copa Libertadores da América vem mostrando isso. O Del Valle, por exemplo, pode levantar o troféu mais disputado da América sem sequer ter sido alguma vez na vida campeão nacional em seu país. Sua classificação às finais sobre o grandalhão Boca Juniors pode até ser uma surpresa considerada histórica, porém é incontestável.
Assim como o triunfo do Nacional, o de Medelín, vencendo o São Paulo por 4 x 1 no placar agregado, pode ter sido considerado polêmico em razão da arbitragem, mas inegavelmente merecido dentro de campo. O time colombiano teve campanha invejável e ainda na etapa de grupos já mostrava futebol suficiente para chegar onde chegou.
E os finalistas possuem pontos-chave em comum: jogam de forma compacta, são muito bem organizados coletivamente, têm vocação ofensiva e estão confiantes. Ingredientes que os fizeram silenciar tantas vozes de torcedores adversários que acreditaram somente no "peso de suas camisas", o que para muitos já bastava para espantar as zebras e selar a famosa "química" com o torneio sul-americano. Não deu certo. Jogando bola, a história foi outra.
Nada de Orión, Pavón, Tevez e Lodeiro. Nada de Calleri, Ganso e Lugano. A história do futebol sul-americano em 2016 está sendo escrita por Jefferson Orejuela, Bryan Cabezas, Junior Sornoza e Jose Angulo. E por Macnelly Torres, Marlos Moreno e Miguel Borja.
Nada de Guillermo Schelotto ou Patón Bauza. Na beira do campo, as estrelas de uma constelação menos brilhante são Pablo Repetto e Reinaldo Rueda.
Nada de Bombonera ou Morumbi. Os palcos que decidem a Libertadores são Atahualpa e Atanasio Girardot.
Foi-se o tempo em que a "tradição" era o suficiente e nesses dias tão estranhos para muitos, a bola pune quem joga apenas com o tal do "peso da camisa", até mesmo "aquela que entorta varal". Atlético Nacional x Independiente Del Valle nas finais da Copa Libertadores é o rolo-compressor em cima dessa antiga máxima.




Adriano Oliveira tem este Blog desde 2009, mas a paixão pelo futebol nasceu bem antes disso. É um apaixonado que vibra pelas 11 posições, mas sempre assume uma, pois jamais fica em cima do muro. Aos 43 anos, o futebol ainda o faz sentir a mesma coisa que ele sentia aos 10.

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