domingo, 12 de janeiro de 2014

ESPERANÇAS, SONHOS E LIÇÕES DOS MENINOS DA COPA SÃO PAULO

Nos rincões pelo interior do Brasil, o futebol continua sendo a oportunidade rara de milhares de garotos que sonham com uma vida melhor. Se não melhor, pelo menos mais digna. Os milhares se tornam centenas, depois dezenas, depois somente alguns. Algumas vezes, nenhum. Mas é preciso acreditar. E mostrar o trato com a bola nos pés. Afinal, a bola rebola nos pés de quem sabe jogar, seja no Maracanã ou em qualquer terrão do Planalto Central do país. Talento é talento e isso ninguém pode tirar.
Diante disso, quantas esperanças não viajam dias de ônibus para participar da Copa São Paulo de Futebol Júnior? Quantos “inhos” não vislumbram jogar bola durante uma semana em São Paulo para tentar a sorte grande de, através do futebol, tentar ser alguém na vida? São os Zezinhos, Luisinhos, Huguinhos, Joãozinhos, Jairzinhos, Ricardinhos, Osvaldinhos, Carlinhos, Antoninhos, Romarinhos, Pelezinhos e uma infinidade de outros “inhos” por aí. Durante toda a viagem, dentro de um ônibus barulhento e desconfortável, um calor quase insuportável entra pelas janelas e a paisagem rude os faz manter na lembrança a vida sofrida que esperam poder deixar para trás. Fazem planos, sonham em poder oferecer à mãe uma condição melhor de vida, seja uma casa melhor, ou simplesmente um prato de comida mais saboroso na mesa. Homens desonestos já ofereceram vida melhor em troca de favores igualmente desonestos. Melhor não. Já conhecem as faces da violência, das drogas, do álcool. Tem exemplos ruins na família, e nas famílias dos vizinhos. Carrega consigo uma esperança em forma de chuteira que pode mudar todo esse cenário de maneira honesta. Aliás, chuteira e uniforme que foram presentes de um famoso político que sempre aparece em seu bairro de quatro em quatro anos, sabe-se lá porquê. Mas isso não importa. Agora só depende dele. Afinal, tem treinado bastante para essa oportunidade. Jogou demais, se esforçou para ser um dos escolhidos pelo professor para estar ali agora naquela viagem cansativa, demorada, calorenta, mas cheia de esperanças. Ficou sabendo que outro homem, amigo desse político famoso que de tempos em tempos aparece em seu bairro, ofereceu dinheiro ao professor do time para que um outro time de outra cidade fosse para São Paulo no lugar do seu. Sua mãe lhe disse que a bolada era boa. Mas o professor recusou. Disse para o prefeito que a participação na Copa de juniores daria visibilidade para a cidade e que isso era bom. Graças a Deus que tudo deu certo. Nunca tinha visto ninguém recusar tanto dinheiro, mas o professor era um cara inteligente e todos os moleques confiavam nele. Acreditavam que sempre faria o melhor por eles.
Chegaram. Jogaram. Perderam. De goleada. Foi o cansaço. A alimentação também, quem sabe. Mas não faltou vontade. Eles tentaram. Dífícil jogar contra time grande. Os caras do time grande pareciam gigantes perto deles. E como corriam. E não se cansavam. Pelo menos não tanto quanto eles se cansavam. E tocavam muito bem na bola, quase sempre em dois toques. Será que era porque a chuteira deles era melhor? Bem, tudo deles era melhor, essa era a verdade. Mas a vida é assim. Legal foi a cordialidade dos médicos do time grande que os atendiam em campo quando eles precisavam. Davam até remédios. E não reclamaram nenhuma vez. Legal isso.
Ele jogou bem, apesar das derrotas acachapantes. O professor até o elogiou, apesar de tudo. E percebeu que alguns homens pediam informações sobre ele para seu professor. Um garoto de seu time lhe disse que os tais homens pareciam estar interessados em levá-lo para fazer uns testes em times de São Paulo. Bem, era exatamente essa a idéia. Se esforçar e jogar bem. Mesmo sabendo que não teriam chances de vitória.
E a vitória era justamente essa. Dar o seu melhor. Sua mãe ficaria orgulhosa. Jogar bola era o que ele sabia fazer de melhor e ele fez o melhor. E não se sentiu envergonhado pelas derrotas. Vergonha é matar, roubar, cair na conversa de pessoas desonestas. Ele ainda acreditava que o futebol lhe traria uma vida melhor. E agradeceu ao professor por ter lhe ajudado a tentar. E se sentiu alguém na vida por conta disso. Ano que vem tem Copa São Paulo de novo. E ele vai continuar tentando. Afinal, a viagem nem é tão cansativa assim. O sonho do futebol vale a pena.

Leia: "Time do Tocantins que levou 21 gols em 2 jogos recusou vender vaga na Copinha" - Esporte IG  http://migre.me/hoOMT

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