terça-feira, 7 de abril de 2015

A CIÊNCIA EXATA DE MURICY RAMALHO

Nunca morri de amores pelo trabalho de Muricy Ramalho. Longe disso.
Um treinador que não gosta de jogar para frente. Seus times quase sempre jogam por aquela bola salvadora dentro da área que chega na cabeça de algum jogador através de um cruzamento. A ordem tática normalmente é jogar para não levar gols. E para que correr riscos utilizando jovens jogadores quando se pode dividir a responsabilidade com medalhões consagrados? Para Muricy, futebol é quase uma ciência exata. E não é.
Com exceção do Palmeiras (por que será?), Muricy foi campeão por todos os times em que passou. É verdade. Mas todos os títulos conquistados foram com grandes equipes, quase sempre já montadas. Foi assim logo depois dos títulos de 2005 do São Paulo, em 2010 pelo Fluminense e no Santos de 2011. Times de qualidade, já formados, com grandes talentos individuais, encaixados em campo.
No Santos, por exemplo. Quando o time se desfez da brilhante base de 2010 e 2011, Muricy teve enorme dificuldade para montar e treinar o elenco a partir de 2012. Pior: não conseguia fazer o time jogar sem Neymar. O ex-técnico chegou a escalar Arouca e (pasmem) Gerson Magrão como meias de ligação em várias partidas. Gostava de improvisar o zagueiro Durval como lateral. E insistia ver em Juan qualidades que ninguém mais conseguia enxergar. Assim como Zé Love, André e Pará, Muricy Ramalho também dependia do futebol de Neymar. No Campeonato Brasileiro de 2012, com Neymar em campo, o Santos tinha atuações de time campeão. Sem o craque, tinha campanha de time rebaixado. Muricy assumiu um Santos irretocável a partir das quartas-de-final da Copa Libertadores de 2011 e foi campeão. Depois disso, veio o desmanche do time e o decréscimo de resultados. E a situação ficou insustentável para ele na Vila Belmiro. O treinador também tinha enorme resistência em aproveitar jogadores das categorias de base, o que sempre foi uma marca registrada do Santos.
Carrancudo, ranzinza, tenso. Esse é, na maioria das vezes, o status de Muricy Ramalho na beira do campo e nas entrevistas. Futebol é trabalho sim, mas também é alegria, é diversão, é irreverência. Muricy é sim um técnico vitorioso. Ganhou muitos títulos, tirou o São Paulo do rebaixamento em 2013 (o que, na verdade, não aconteceria mesmo com outro treinador). Porém, sua relação com os jogadores se tornam desgastantes no decorer do tempo, em quase todos os times em que ele já trabalhou. Pouco motivacional, nunca teve seus times "na mão".
Visivelmente debilitado devido à problemas de saúde que o assolam há dois ou três anos, ele acaba de deixar novamente o São Paulo. Desde setembro de 2013 em seu clube de coração, onde "seu contrato sequer tem multa", como ele próprio diz, Muricy decidiu entregar o cargo sem nenhum título conquistado e com quatro eliminações em mata-matas dentro do Morumbi. Os resultados são a única matemática do futebol, especialmente os negativos. E talvez menos pela diverticulite e mais por não conseguir fazer o time jogar dessa vez sem a liderança de Kaká, que também era referência dentro e fora de campo em 2014, o técnico tomou a decisão de sair em comum acordo entre ambas as partes.
Chegou a hora cuidar da saúde, da vida, de pescar, de descansar. Porque assim como o futebol, a vida também não é uma ciência exata.

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