quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

UMA LADY CATALÃ QUE RESPIRA FUTEBOL

Priscila Ruiz é executiva, taurina sem meio termo e respira futebol. Colabora com o AL MANAK FC através de seus textos sempre impecáveis, com opiniões inteligentes e analíticas. São-paulina e Culé apaixonada, na entrevista abaixo ela diz entender que o futebol brasileiro não é mais o que foi e tão cedo não voltará a ser, conta que uma de suas maiores tristezas no mundo da bola foi a saída de Raí para o futebol francês e acredita na mudança do brasileiro a partir de si mesmo para que talvez tenhamos no futuro um Estado como nação.
Realista, Priscila é uma lady catalã. Doce, porém de sangue quente, quem sabe um caos na imensidão de águas calmas. E seguramente para ela "la vida es aquello que sucede cuando no hay fútbol".
A seguir, um pouco mais do que pensa a indefinível Priscila Ruiz.



- Qual é o seu sentimento hoje em relação à seleção brasileira? Consegue torcer?
Somos o país genuinamente do futebol e a desconfiança frente ao passado recente perdura e assombra o nosso presente que é, de fato, dúbio. É um sentimento inevitável. Como torcedora lúcida não perderei a capacidade de me indignar, mas jamais torcerei contra. Sou corneta, mas sou uma romântica do futebol!



- 7 x 1 foi pouco?
Se analisar a evolução dos fatos, o 7 x 1 começou a ser construído na derrota para a Holanda na Copa de 2010. Não foi pouco. A questão é como se lidou com isso.
Esperávamos uma reforma profunda que não veio e a vida seguiu como se nada tivesse acontecido. Muito diferente do Maracanazzo que causou um choque à sociedade brasileira e trouxe mudanças ao futebol da época.


- O futebol brasileiro está mudando?
Não sei se está mudando ou se está se revelando e mostrando a sua faceta atual.
Há constatações doloridas desde as peneiras nos “terrões” da vida, a geração da meninada que só tem as referências internacionais, os jogadores que não buscam mais ser atletas e sim celebridades, os clubes afundados em dívidas. Sem falar na parte técnica e tática, na ausência de revelação de grandes talentos e de times brilhantes.
O fato é, não somos mais o que fomos. E tão cedo não voltaremos a ser.


- Qual foi sua maior tristeza no futebol?
7 x 1 não vale! Tenho duas vividas in loco e uma que sempre carregarei no coração.
A derrota do São Paulo frente ao Vélez Sársfield, na final da Libertadores de 1994. Era uma menina chorando copiosamente na arquibancada do Morumbi.
A derrota abissal do Brasil na Copa da França. Estava em Paris assistindo à partida na Praça do Hôtel de Ville e olhava incrédula ao telão, enquanto Zidane e cia passeavam sobre o nosso time.
E aquela que ficará para sempre será a saída de Raí do São Paulo para o PSG.

- Final do Mundial de Clubes entre São Paulo x Barcelona. Para quem você torceu em 1992 e para quem torceria hoje?
Eu torci para o São Paulo e torceria sempre. Não faça essa pergunta à ala antiga dos Ruiz (risos).

- É seu jogo inesquecível?
Sim, São Paulo x Barcelona na final do Mundial Interclubes de 1992. Mais inesquecível que o jogo foi o sorriso do Telê Santana no momento do gol do Raí.

- O maior golaço que você já viu?
Que roubada, já vi tantos!
Repito, não foi o maior golaço, mas foi o mais importante da minha vida – o gol de falta de Raí contra o Barcelona.
E embora já tenham acontecido outros mais bonitos pelo mundo, confesso que o gol de Neymar contra o Flamengo não sai da minha cabeça.


- E o maior golaço que você já fez na vida?
Ainda há um longo caminho a percorrer, mas o meu maior golaço é a minha carreira.

- Maradona ou Pelé?
Pelé. Simples assim.

- Lionel Messi é ou será o maior jogador de todos os tempos?
Messi é o maior jogador do futebol contemporâneo, integra e integrará o rol das maiores estrelas de todos os tempos.


- Paulo Henrique Ganso é craque?
Penso que o que se questiona quanto ao Paulo Henrique não seja a sua qualidade. Mas, sim, a sua postura dentro de campo e frente aos companheiros de time.
É um jogador que passa a percepção que nunca está pronto e que não se pode contar com ele. Mas é craque, sim. Eu xingo, mas acredito nele.


- Qual foi o melhor São Paulo que você viu jogar?
Os times de 92 e 93. Eram times diferentes, mas um foi tão bom quanto o outro.

- O Barcelona de 2009 a 2011 foi o time dos sonhos?
Foi e não só por causa de seus craques e de sua qualidade. Mas porque apresentou ao mundo uma renovação do futebol. Esse é o encanto, em minha opinião.

- Pep Guardiola é o melhor treinador do mundo?
Há controvérsias, mas sim. Pep Guardiola é um cientista. Vejam que ele não trouxe nada de tão novo ao futebol, afinal retomou elementos já utilizados por times nos anos 70 e 80.
O estilo dele se consolidou com um banho de loja, especialmente na repetição da troca de passes em espaços reduzidos do campo, o que trouxe harmonia ao time. Além do foco na disciplina tática que elevou muito os patamares tanto do Barcelona quanto do Bayern.


- Você gostaria de ver algum ex-jogador na presidência da CBF?
A CBF em seu estatuto, dentre os seus objetivos, tem a responsabilidade em praticar todos os atos necessários à realização da direção nacional do futebol no país.
Sendo assim, ex-jogador ou não, gostaria de ver alguém com o currículo que a posição necessita. E enfatizo currículo, porque minimamente se espera alguém profissional e experiente o bastante para conduzir uma entidade desse porte.


- Trocaria São Paulo por qual cidade para viver?
Sinceramente, com todas as minhas andanças por aí, afirmo que me adaptaria em qualquer lugar. Mas se precisasse escolher viveria no Rio de Janeiro, em Nova York ou em qualquer cidade da Europa, especialmente na Espanha, claro.

- Quem deveria ser hoje o técnico da seleção brasileira?
Desafiaria Tite a mostrar o seu valor ou um estrangeiro de peso na tentativa de uma nova filosofia.

- Para você, qual é o maior clássico do futebol brasileiro?
Grêmio x Inter é pegado. E creio que São Paulo x Corinthians superou Palmeiras x Corinthians.

- Real Madrid x Barcelona é a maior rivalidade do futebol no mundo?
Sim, junto com Boca x River. E outro que merece ser citado também é Rangers x Celtic.

- Qual é o talento que você mais aprecia em você e que mais gosta de usar no cotidiano?
O meu estilo de liderança servidora e afetiva. O que eu faço de melhor é cuidar dos outros.

- No Brasil, o sucesso incomoda?
Sim, no Brasil e no mundo. Desde sempre, talvez por aspectos da nossa cultura e da educação que recebemos, temos a tendência de nos prender em dogmas engessados por conforto e gastamos tempo com as críticas. São pitadas de egoísmo em um mundo desprovido de empatia.
Todos, sem exceção, temos talentos e um lugar ao sol. A diferença é como cada um de nós vai buscar, se estabelecer e se comportar diante disso.


- Prefere ver seu time perder a jogar mal? Ou o que importa de fato são os três pontos?
Importa os três pontos. Inadmissível é o time perder demonstrando apatia, falta de raça e de amor à camisa.

- Para você, o inglês Chelsea equivale a qual time no Brasil?
O povo brinca com essas coisas. Não sei, não sou dada às comparações, mas sem olhar para o time e pegar um pouco do gancho místico, o Arsenal poderia ser o nosso Botafogo do Rio.

- Mata-mata ou pontos corridos?
De olhos fechados, mata-mata. Não me julguem!

- A Espanha é hoje uma potência do futebol mundial?
Junto com a Alemanha. Não vejo mais a Espanha soberana.

- Raí ou Zidane?
O jogador com mais classe que vi jogar foi Zidane. Entretanto, Raí tem um conjunto de obra dentro e fora de campo que sempre me fará escolhê-lo.


- Deco, Ronaldinho e Eto’o ou Messi, Suárez e Neymar?
MSN.

- Você aprova a longa permanência de técnicos em clubes?

Aprovo a continuidade planejada visando a sustentabilidade. Trabalho de curto prazo para mim é projeto. E não vejo um clube trabalhando sob essa concepção.

- Qual é o time mais “rejeitado” do futebol brasileiro? E por que?
Corinthians e Flamengo, justamente por serem os mais amados, sempre serão também os mais rejeitados.

- Morumbi ou Camp Nou?
Essa não vale (risos). Pode ser um mix dos dois?
Camp Nou.


- Quais os campeonatos de futebol mais competitivos do mundo?
As pesquisas podem até mostrar outra coisa. Mas, em minha observação, os mais competitivos são Brasil e Inglaterra, pelo fato de mais times estarem nivelados.
Itália, Argentina e Alemanha também merecem atenção.

- O Campeonato Espanhol só possui dois times. É exagerada essa afirmação?
Vamos perguntar para a turma do Atlético de Madrid (risos)? Embora seja inegável a supremacia de Barcelona e Real Madrid, acho exagerada sim.


- Muricy Ramalho ou Tite?
Essa é uma opinião pessoal, desprovida de análises profundas, mesmo porque em termos de carreira, eles têm uma trajetória parecida.
Muricy Ramalho, porque gosto dele e ponto.


- Fred foi injustiçado na Copa?
Não. Injustiçados fomos nós, torcedores.

- A arbitragem brasileira é tendenciosa ou só é ruim mesmo?
São requisitos complementares. A arbitragem brasileira se torna tendenciosa porque é ruim.


- Se você fosse presidente da República, faria uma Copa do Mundo no Brasil?Não faria nenhum grande evento no Brasil.

- O Brasil ainda tem jeito?
Para a minha geração, dos meus filhos e netos, o Brasil não tem jeito. Não se muda o DNA de um país tão facilmente.
O que tem jeito são os brasileiros. Porque ainda acredito na mudança a partir de nós mesmos e aí quem sabe, num futuro distante, possamos ter, de fato, um país.

- A vida é aquilo que acontece quando não há futebol?

Para mim, essa não é uma questão, mas sim uma afirmação.

- Defina Priscila Ruiz em três palavras.
Três palavras? Fácil.
Eu sou indefinível.


2 comentários:

Unknown disse...

Muito legal conhecer uma mulher que gosta e entende de futebol, um assunto considerado do universo masculino. Já conhecia duas Renata Fan e a tia da minha esposa fanática pelo Corinthians.

Furlantricolor disse...

Falar da Pri é muito Fácil ,pessoa encantadora e doce,conhece futebol como poucos,muito boa a entrevista ,Parabéns !